VELHAS SOMBRAS
Quando chegou a minha vez,
A chama estava fria
E as damas já dormiam empalhadas
Nas torres de enluvadas luas.
Desço pelas ruas perplexas de macadames,
Desbotados tobogãs queimando o silêncio
Por entre as sombras encaixotadas dos muros
E o cheiro da terra sangrada pela chuva,
Terra sagrada que incensa os céus capinados das aves
E nivela o passo do tordo ao estorninho.
Cresce a noite no adágio de violinos míticos,
Que dá ritmo às pernas do meu cavalo,
Feito manadas de antílopes em fuga
E cresce meu coração embriagado por incertezas nulas,
Ante a desprezível possibilidade dos anos
Terem deitado raízes no sal destes olhos,
Cobertos de espinhos.
Sigo por caminhos difusos,
Desviando das pedras que o tempo impõe
Ao outono dos homens.
Subitamente,
Paro diante da velha casa abotoada
Em sua formosa ruína,
Onde as aranhas floriram teias
Como ramadas de caramanchões
Sobre a lembrança dos dias felizes.
A amada não está mais ali,
Suspirando no alpendre ventilado de saudades
Pelo príncipe que apodreceu moço,
Enquanto cavalgava descuidado
Serpentes e ratazanas,
A juventude decotada a se decompor arisca
Como as velas do derradeiro aniversário
E a vida rodopiando sobre um cordão esticado...
Lá adiante,
Desce a noite
Com seu poncho de estrelas nuas,
Carregando as velhas sombras
Que cobrirão teus ossos.
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Do livro "Quando voltarmos a ser pássaros"
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